MARCOS CÂNDIDO MENDONÇA
O Alegre da infância do Sr. Ayrton
Alegre conta com autores que remontam sua história, dentre eles, senhor Ayrton, que relata sobre o Córrego da Brisa.

Alegre conta com uma pequena, mas respeitável coleção de obras históricas sobre sua gente. Essa literatura, com caráter cronista e memorialista, tem contribuído para preservar momentos importantes da história do município. Nela são conhecidos os trabalhos de Manoel Pedro Ferraz, de Carlos Magno Bravo e de Zélia Cassa Oliveira.
Todos esses autores, cada um a seu modo, auxiliaram em recuperar aspectos importantes da colonização do solo da região, da fundação da cidade, e do desenvolvimento do município de Alegre. Sem eles uma parte significativa da história de Alegre teria se esvaído.
Esses trabalhos, embora, quase sempre, careçam de sistematização teórica da narrativa histórica local, foram úteis em descrever fatos e momentos do passado de Alegre. Dentre eles, lembro-me do livro das memórias de infância do Sr. Ayrton J. Santos, publicado com o nome de “Córrego da Brisa”.
A obra em questão é recheada de memórias de Ayrton, levando-nos de volta ao Alegre da década de 1940. A história começa com a viagem de Ayrton da Vila do Sul para o Córrego da Brisa. No decurso da leitura da obra, o leitor é conduzido a conhecer a moradia simples da infância do autor, com o chão da cozinha de terra batida e o chão da sala e dos quartos de assoalho de tábuas que, com passar do tempo, formavam gretas por onde o vento gélido do inverno penetrava.
Dali, passeamos pela Vila do Sul, com sua rua empoeirada ou enlameada, ao gosto das condições do clima e do tempo, até a birosca do Sr. Vitorino, de onde partia, todos os anos, as Folias de Reis. Em seguida, cruzamos com a carrocinha do leite, aprendendo seu caminho do laticínio até o centro da cidade, e conhecemos diversos sujeitos pitorescos da época, entre eles, José Soldadinho (que carregava enorme canivete na cintura).
Também pegamos o trem da Leopoldina Railway Company na Estação de Alegre, que funcionava como centro de convergência e dispersão de tudo e de todos (alimentos, móveis, roupas, calçados, remédios, máquinas, ave, e lógico, café), como se tal lugar fosse o coração da cidade, responsável por conduzir a orquestra da vida econômica do município.
E perambulando pelas ruas, descobrimos a estética da desigualmente urbana do passado. Chegamos as ruas e casarões da elite, com seu charme e pompa, onde, segundo palavras do autor “as moradias eram bonitas e dispunham de varandas, não raro de escadas que sobressaíam do passeio, como se desejasse mostrar que os moradores dali detinha degraus a mais na classificação social”. Nessas vias, como, por exemplo, a Av. Jerônimo Monteiro, as “casas eram cobertas com telhas mais modernas, de limpeza atualizada e imprescindíveis forros”. Modernidade e beleza que espantou o jovem Ayrton quando ele teve a oportunidade de adentrar numa daquelas moradias da alta sociedade alegrense, no caso, a residência do Dr. Francisco Simão, que possuía um chão tão brilhante que deu medo a Ayrton de escorregar.
Por tudo dito e o que mais o leitor poderá encontrar no texto, sugiro que conheçam “Córrego da Brisa”. Acrescento ainda, na condição de pesquisador, que as memórias de Ayrton não são apenas memórias, mas sim um resgate de fatos, personagens e estruturas sociais do passado que são valiosas para a reconstituição da história da cidade de Alegre. Essas memórias valem a leitura e devem ser conhecidas por todos os amantes da história de nossa região.
Marcos Cândido Mendonça é doutor e mestre em Geografia pela Ufes. É autor do livro “O vale do Itabapoana: perspectiva e trajetórias familiares da história do sul capixaba (1820-1960)”. Adquira o livro pela página do @arquivoguacui no Instagram.
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