MARCOS CÂNDIDO MENDONÇA
A Força e Luz Alegre-Veado: energia, intrigas e caixões (Parte II)
Desde o início do funcionamento do serviço, a empresa enfrentou enormes dificuldades para garantir o abastecimento de energia a população.

Como vimos no capítulo anterior, a Força e Luz Alegre-Veado S/A, por meio de contrato de concessão com a Prefeitura Municipal de Alegre, inaugurou a iluminação pública de Alegre e Veado (Guaçuí) em 1920. Desde o início do funcionamento do serviço, a empresa enfrentou enormes dificuldades para garantir o abastecimento de energia a população.
Além dos limites técnicos e financeiros do empreendimento, a Força e Luz teve que lidar com atrasos no pagamento das contas. A situação ficou tão drástica, que em 1929, diante atraso da Prefeitura Municipal de Alegre em honrar seus compromissos, o município de Alegre teve sua iluminação púbica cortada pela empresa, o que gerou grande descontentamento contra o Dr. Trajano Machado da Cruz – então presidente da Força e Luz Alegre-Veado.
Em Guaçuí a situação era talvez ainda pior. A população reclamava dos valores cobrados nas contas e atribuía as faltas da empresa um bloqueio ao desenvolvimento econômico do município. Embora a empresa tenha se esforçado para garantir a ampliação do fornecimento, a situação agravou-se levando a uma greve dos consumidores que se negaram a pagar as contas nos dias de estiagem e de forte racionamento, segundo o argumento da situação ter gerado grandes prejuízos à poppopulação.
Além disso, o movimento de greve, cuja duração extrapolou seis meses, prometia pagar as contas somente após intervenção do governador Francisco Lacerda de Aguiar (1952-1955) para que anistiasse os débitos anteriores. Todo esse reboliço, marcado por acusações mútuas entre as partes – e no qual constou a troca de farpas entre o Dr. Trajano Machado e o governador Lacerda de Aguiar –, abriu caminho para que o governo estadual intervisse e estatizasse a empresa.
Desse modo, o governo do estado, em 1955, adquiriu a maior parte das ações da Força e Luz, que posteriormente foi encampada pelo governo. Contudo, a encampação da empresa contou com um episódio no mínimo singular e que revela o ambiente conflituoso no qual o processo se desenrolou. Em 10 de março de 1956, o jornal A Noite, de circulação na cidade do Rio de Janeiro, noticiou que caixões mortuários foram colocados em frente à sede da empresa para forçar a venda do restante da Força e Luz Alegre-Veado ao governo estadual.
O movimento foi chefiado pelas próprias autoridades municipais e estaduais. Assim, depois de anos de conflito e intrigas, no dia 8 de agosto de 1967, a Força e Luz Alegre-Veado teve o restante de suas ações compradas pelo governo estadual, passando a se chamar Companhia Espírito Santo Meridional de Eletricidade (Cesmel). Posteriormente, em 1975, a empresa foi integrada a Escelsa Espírito Santo Centrais Elétricas.
Marcos Cândido Mendonça é doutor e mestre em Geografia pela Ufes. É autor do livro “História da construção de Guaçuí: aspectos da formação urbana no vale do Itabapoana capixaba (1920-1960)”. Dedica-se ao estudo da produção do espaço e geografia histórica do Espírito Santo. (Adquira o livro na página @arquivoguacui no Instagram).
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